segunda-feira, 24 de junho de 2013

Eu já entrei na educação com o pé esquerdo

Por: José Mendes Pereira

Em mil novecentos e oitenta e três eu fui encaminhado à Escola Estadual Professor Manoel João para assumir uma vaga de professor e lecionar português.  Essa indicação foi feita por Laurita Rosado e Laurenisa Maia, através do trem da alegria. 
            
No dia vinte e três de Maio eu recebi o meu encaminhamento, e no dia seguinte, às nove horas, pela manhã, fui ao antigo Nure, hoje Dired, para fazer o meu cadastro funcional.
 
Noutros tempos, o Nure funcionava no Pio XII (anteriormente era uma repartição religiosa, dirigida por freiras, e que dava apoio a moças que tinham sido decepcionadas na vida amorosa, uma espécie de convento, eu não posso afirmar com clareza, e posteriormente ela foi desativada pela direção da Diocese de Mossoró).  
                 
Quando eu cheguei ao Nure em um pequeno corredor, como chamamos popularmente, de um lado e do outro, um grupinho de pessoas se encontrava sentado. Ao passar no meio dele, no lado esquerdo, surgiu um murmúrio de risos baixinho no ambiente, mas eu me segurei e fiz de conta que nada estava acontecendo.
           
Na sequência, caminhei em direção à sala onde estava a diretora do Nure, Zilda Maria Cabral, e a entreguei o encaminhamento, mas recebi através dela, uma informação desagradável, de que no momento não tinha vaga para professor, e sim, para “Téc-D.” Não pensei duas vezes, e aceitei a proposta de me contratarem como “Téc-D”, pois eu estava vivendo de uma pequena quitanda, no conjunto Ulrick Graff, e com muitas dificuldades financeiras.
             
Após as suas explicações, fui informado de que eu teria que retornar ao órgão no dia seguinte, porque a moça encarregada do setor, isto é, de onde começavam os registros, havia saído para resolver problemas relacionados com o mesmo. Ela me disse o nome da pessoa, mas assim que eu saí da sua sala, esqueci-me por completo. 
               
Saí meio apressado para que o grupinho não repetisse mais os risos, e por sorte minha, não havia mais ninguém no lugar. Desci os degraus, passei pelo portão, parei um pouco sob uma das caixas de água que fica em frente, pitei, usando a minha imbecilidade, e em seguida resolvi voltar para apanhar o nome da moça que eu havia me esquecido.
          
E novamente retornei ao local, e em um dos recantos do corredor, tinha uma senhora prestando informações às pessoas que ali chegavam. Expliquei o meu problema, e ela escrevinhou às pressas, em um papelzinho e me passou. Eu pensando que ela estava me entregando o nome da moça a qual eu deveria falar no dia seguinte, recebi-o, enfiei no bolso e fui-me embora.
           
Só mais tarde quando eu cheguei em minha casa foi que eu descobri que o bilhete dizia assim:

“Os risos que surgiram no corredor foram causados porque o lado esquerdo da sua calça está descosturado até ao joelho”. (Que coisa hein!).

“A senhora que me atendeu eu acredito que já está gozando os seus direitos, isto é, aposentada, pois nunca mais a vi na Dired”.


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José Mendes Pereira

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VÁRIOS ANOS DE PENSAMENTOS PERDIDOS

Por: José Mendes Pereira

Entre as décadas de 40 e 50, do século XX

Luiz Gameleira de Barros era açuense, mas registrado mossoroense; ainda pequeno veio residir em Mossoró, em companhia da mãe, que ficara viúva logo que nasceu. Aos seis anos de idade, já ajudava a mãe, na profissão de engraxate, e até diziam que ele foi o primeiro engraxate de Mossoró. Os tempos foram se passando, o menino foi se formando, mas sempre zelando pela sua profissão.

Em uma das visitas a Mossoró, o advogado Dr. Café Filho, que ainda nem sonhava ser algum dia Presidente da República, Luiz Gameleira prestou os seus serviços de engraxate. Como Luiz era um jovem esperto, de bom papo, apesar de pouco ter frequentado escola, mas vivia no meio da gente instruída, usava o Português muito bem, com isso fez com que Dr. Café Filho desejasse levá-lo para trabalhar com ele como menino de recado, isto é (office-boy). Se antes dominava o português, vivendo no meio dos sábios, muito mais se desenvolveu.

Acontece que em 1950, Dr. Café Filho foi eleito a Vice-Presidente da República, assumindo o cargo em 31 de janeiro de 1951; e com isso, desfez do seu escritório de Advocacia, mas prometendo a Luiz Gameleira que iria cuidar de um emprego para ele. Terminado o escritório de advocacia, Luiz Gameleira retornou a Mossoró, e aqui partiu para o comércio, estabelecendo-se à Rua Alberto Maranhão, no ramo de miudezas. Não era um comércio que se diz: “como é grande”, mas vivia muito bem, obrigado.

 Presidente Café Filho

Os dias foram se passando, mês e mês, chegando a ano, e Luiz ainda aguardava o seu novo emprego, que como fora um bom empregado do então vice presidente da república, com certeza seria lotado no Palácio Presidencial, no Rio de Janeiro.

Getúlio Vargas

Em Agosto de 1954, o Presidente Getúlio Vargas suicidou-se, e Café Filho subiu ao maior posto de poderes do Brasil, agora era presidente da República. 

Luiz Gameleira que sonhava ocupar um cantinho naquele governo, quem sabe, secretário, assessor do presidente, uma coisa qualquer, ou até mesmo uma pasta de um dos Ministérios, dois meses depois que Café Filho assumiu o governo da república, um telegrama chegou à casa de Luiz Gameleira, comunicando-lhe que ele teria que se apresentar ao novo presidente brasileiro.

Se antes Luiz Gameleira gozava de certo prestígio em Mossoró, sua fama cresceu de vez, onde recebia parabéns a todo o momento, e nos tímidos lábios da população era o que bocejavam. E até já o chamavam de “Ministro”.

Com a convocação para se fazer presente ao novo presidente da república, Luiz empolgou-se tanto, que antes de viajar para o Rio de Janeiro, fez festas e mais festas com toda vizinhança. Alugou um prédio na mesma avenida, convocou a banda Municipal, que na época ainda não tinha conjuntos para festividades, e aí foi festão. Uma enorme bandeira do Brasil foi colocada em frente à entrada, e sobre ela, duas palavras diziam assim: “MORRA PELA PÁTRIA”


Um pobre bêbado que no momento rodopiava no meio da multidão, ao ver a frase sobre a bandeira, cuspiu-a, dizendo: “-Que morrer por pátria que nada! Morra quem quiser! Eu não!"

Luiz Gameleira ao ver o desprezo do bêbado com a bandeira, já se achando autoridade, mandou que fossem apanhar a polícia. E não demorou muito para que o miserável fosse guindado.

Lá pras tantas a festa terminou. Luiz precisava se arrumar para se dirigir até Natal, e lá, apanhar um velho e cansado transporte, indo até Recife e de lá pegaria outro até Rio de Janeiro. Foram mais de seis dias e seis noites de viagem, até que conseguiu colocar os pés na cidade maravilhosa.

Ao chegar, dirigiu-se a uma pequena e deteriorada pensão, “coisas doutros tempos”, e lá se amparou até o dia seguinte, quando iria se dirigir ao Palácio Presidencial, para receber o seu tão desejado emprego.

No dia seguinte, banhou-se, tomou café e se dirigiu ao Palácio. Levou três dias para conseguir audiência com o Presidente, até que falou com um dos assessores do Presidente, que levou o assunto a Café Filho sobre a presença de Luiz Gameleira ao Palácio.

Café Filho o disse que primeiro o levasse a um restaurante, alimentasse-o e depois retornasse com ele à sua sala.  Mas antes lhe disse: “-Mande servi-lo bastante. Não deixe o homem com fome. Ele é nordestino e nordestino quando não está com fome, não demora muito ter fome, porque a fome sempre está ao seu lado”.

Terminada a refeição voltaram ao Palácio. Café Filho já estava preparado para receber o seu conterrâneo. Se o homem era faminto, o presidente Café Filho, no momento, não, mas antes fora um dos tais.

Os abraços e lembranças antigas foram vividos entre os dois. Café Filho relatou as dificuldades que tinha quando os seus clientes não pagavam os seus serviços sobre  causas judiciais, penais e serviços diversos.

Terminada a palestra entre eles, Café Filho abriu a página sobre o seu emprego. Iria mandá-lo para a Amazônia, trabalhar como seringal na extração do látex.

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Um dos melhores empregos que no momento ele iria o ofertar. Explicou, explicou os riscos, as vantagens, o pagamento que seria feito mensalmente... E em seguida perguntou-lhe:

- Está pronto para trabalhar na Amazônia, na função de seringal, Luiz? 

- O Senhor está me dizendo que é este o emprego que tem para mim?

- E dos melhores, Luiz. Está pronto para assumi-lo? 

Não Senhor, Dr. Café Filho. Não Senhor! O senhor sabe muito bem que eu nunca trabalhei como seringal. Não tenho a mínima ideia como é este trabalho.

- Mas quem não sabe, aprende! Eu vivia lá em Natal, sofrendo juntamente com você. Hoje sou Presidente deste imenso Brasil... Eu não tinha a mínima ideia como se administrava um país...

- Sou franco em lhe dizer, Dr. Café Filho – dizia Luiz Gameleira já de cara fechada. Eu agradeço o seu emprego. E o Senhor me desculpe as minhas francas, grosseiras e sinceras palavras.  "Quem tira leite de pau é buce.." - Disse e de imediato se retirou da presença do Presidente Café Filho.

Publicado também no site:
http://www.folhadodelegado.jex.com.br/licoes+de+vida/varios+anos+de+pensamentos+perdidos
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