domingo, 27 de abril de 2014

Seu Galdino conta história ao seu Leodoro na debulha de feijão em sua casa.

Por José Mendes Pereira

Nessa noite os convidados para a debulha de feijão na casa do seu Galdino eram poucos. O vaqueiro do fazendeiro Lili Duarte, este acompanhado da esposa; outro casal das suas amizades, acompanhados dos seus dois filhos com as suas  esposas,´mais ele e sua esposa dona Dionísia. Mas para seu Galdino,  de todos, os mais importantes naquela debulha de feijão era seu Leodoro Gusmão, seu melhor amigo e compadre de muitos anos, mais a  sua esposa Gertrudes, uma paixão incondicional do seu Galdino.

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A conversa no meio da debulha do feijão continuava animada, e o vaqueiro do Lili Duarte contava as suas aventuras na derruba de gado, que nunca havia perdido nenhuma rês, quando decidia botar o seu famoso cavalo (o Tango, como era chamado), em cima de uma delas qualquer, só parava quando o animal já estava totalmente dominado. Mascarava-o, e o tangia em busca da fazenda.


Outras e outras histórias interessantes e até engraçadas surgiram no período da debulha. Mas ainda faltava a mais fantástica e famosa história que iria ser contada pelo o dono da debulha do feijão, seu Galdino, que desde muito cedo, já havia a preparado para contá-la no meio da debulha do feijão.

Sentado sobre um tamborete fabricado com madeira de pereiro, e coberto com couro cru de rês, ajeitou-se um pouco sobre ele, virou o rosto para um dos lados, acendeu um cigarro feito com fumo fabricado em Arapiraca, cuspiu, e em seguida iniciou a sua história.

- Em uma das minhas caçadas pelos cerrados, acompanhado do Rodolfo, um dos meus vizinhos e amigos, mais os nossos invejados cães de caças (o leão e o poty), perdemos-nos na Serra do Mel, e não entendemos porque havíamos se perdido ali naquela mata, lugar que nós tanto  frequentamos de olhos vedados.

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- Como nós já estávamos cansados e necessitávamos de um repouso, continuava seu Galdino, resolvemos  arriar a bagagem, cuidar de um fogo para fazermos um delicioso café e alimentarmos os nossos intestinos, porque quando a noite chegasse,  a caminhada nos tabuleiros seria pesada em busca de alguns pebas, tatus, tamanduás e outros viventes... O Rodolfo apoderou-se de um facão, afirmando-me que iria tirar umas cascas de mororó para fazer buchas para a sua espingarda, e nessa saída, Rodolfo deparou-se com umas pedras semelhantes grutas, e vendo uma fenda entre uma e outra, desejou ver o que as pedras escondiam ali. E sem calcular o tamanho da fenda, deitou-se ao chão, enfiou a cabeça, que para este fim, não foi difícil. Mas o Rodolfo não levou sorte. Ao forçar a cabeça no pequeno espaço das pedras para olhar para dentro, infelizmente não conseguiu mais sair dali, ficando com a cabeça presa, sem condições de se livrar da fenda.

- Meu Deus! - fez seu Leodoro.

- Sim senhor! O sol já pendia muito para o poente. Eu preocupado com o não retorno do Rodolfo, fiquei gritando, imaginando que ele poderia ouvir os meus gritos por onde se encontrava. Mas o Rodolfo não respondia ao meu chamado. E sem outra solução saí à sua procura dele, até que o encontrei enganchado na fenda das pedras.

- Nossa senhora! - Fez a Gertrudes, esposa do seu leodoro.

- E a partir daquele instante só foi sofrimento para nós. O Rodolfo tentou todas as maneiras, mas quanto mais procurava se livrar das pedras, mais enganchado ficava. O sangue já descia pelo o corpo abaixo, saindo por pequenos cortes feitos pelas pedras.  Eu imaginei voltar ao acampamento improvisado, para apanhar uma picareta para quebrar parte de uma das pedras, mas não havia como usá-la ali, porque qualquer pancada que eu desse sobre uma delas, iria machucar o Rodolfo. Sem solução, eu e os cachorros ficamos a noite toda ao seu redor.

- E deu para o senhor dormir, compadre Galdino?

- Eu nem imaginei dormir, porque o Rodolfo não deixava. O tempo todo invocava todos os Santos..., a noite se foi, e ao clarear do dia, o estado de saúde do Rodolfo não era bom; passara a noite em vexames, não dormiu, porque a posição da sua cabeça entre as pedras não lhe favorecia dormir. Eu não sabia mais o que fazer para salvar o Rodolfo. Foi-se o dia e novamente chegou a noite. O Rodolfo não tinha como sair dali. Durante estes dois dias preso entre as pedras, o Rodolfo não comeu e nem bebeu. Já no terceiro dia, ele me liberou, dizendo-me que fosse embora. O fim dele era ali mesmo, enganchado naquelas pedras. Que eu desse lembranças à esposa, aos filhos, parentes e amigos. Para procurar o corpo de bombeiro em Mossoró não seria tão fácil, já que eu teria que enfrentar a pé mais de 40 quilômetros, e com certeza, ao retornar, eu não encontraria mais o Rodolfo vivo naquelas matas. Despedi-me do amigo e saí lentamente acompanhado pelos cachorros, com um arrocho em meu coração, por eu não ter conseguido livrar o amigo daquelas pedras.


Mas ao sair, já com mais de 200 metros caminhado, lembrei-me que o Rodolfo tinha muito medo de onça. Resolvi voltar para tentar o último recurso e ver se salvava o meu amigo. E aproximando-me do Rodolfo, cuidadosamente esturrei como onça. Mesmo já debilitado, com medo, o Rodolfo puxou a cabeça de vez, e com isso livrou-se das malditas pedras que há três dias o conservavam preso pela a cabeça. 

- Que sorte hein compadre Galdino, teve o Rodolfo! -  exclamou seu Leodoro.

- Foi muita sorte! Muita! Mas em compensação as suas orelhas ficaram entre as pedras. Mas é melhor vivo lambi do que morto com as orelhas. - disse seu Galdino com deboche.


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