segunda-feira, 5 de agosto de 2013

Seu Galdino e a onça pintada ecológica

Por José Mendes Pereira
José Mendes Pereira

Seu Galdino amanheceu sorrindo, porque estava feliz com o presente que as suas famosas vacas haviam lhe dado. O dia anterior nascera cinco nutridos bezerros, e até se admirava da sorte que teve, em plena seca, pouco pasto e água difícil, carregada para sua fazenda em lombos de animais magros.

Seu vizinho, o compadre Leodoro, não tivera a mesma sorte. De duas vacas amojadas, apenas uma dera bezerro, a outra, o médico veterinário que havia cuidado dela, dissera que o feto morrera ainda na mãe, e dias depois fora comprovado ao pari-lo.

Entre uma conversa e outra, seu Galdino e seu Leodoro permaneciam reparando uma cerca que dividia as suas propriedades. Ninguém por perto, só o vaqueiro do Lili Duarte, o Leandro, que seguia na frente do famoso rebanho de gado do fazendeiro, levando-o para o cerco.

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Já eram 9 horas do dia, e o sol quente, empurrava-os para a sombra de um juazeiro, que viçosamente frondeava e ensombrava a estrema das suas propriedades. Amparados, resolveram fazer uma merenda de gergelim, rapadura, leite, batata e mais outros alimentos. O café seu Galdino havia levado prontinho de casa.

Ali, sob a maravilhosa sombra do juazeiro, seu Galdino espantou-se, levantando-se de imediato do lugar em que sentara, afirmando ao seu Leodoro, que ouvira um esturro de uma onça, e pelas suas experiências, a onça era pintada.

Seu Leodoro atalhou dizendo-lhe que deveria ser onça vermelha, porque onça pintada naquela região, ele não tinha notícias que alguma delas havia percorrido aquelas terras. E entre a onça pintada e a vermelha, concordaram em admitir que fosse mesmo uma onça vermelha.

Seu Galdino não tinha ouvido nenhum esturro de onças, o que ele estava querendo, era entrar no assunto sobre onças, para contar ao seu Leodoro uma de suas lorotas.

E como já estava com uma inteirinha planejada, deu início à sua história, dizendo-lhe que certa feita quando campeava seus animais, deparara-se com uma onça pintada

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deitada em um galho de uma árvore, derreado sobre o riacho das éguas, lá para as bandas da Favela, bem próximo ao Cordão de Sombras, nas terras do ricaço de Mossoró Francisco Souto.

Edite Souto e Soutinho - www.kareninefernandes.com

Escapara das mandíbulas daquele felino, porque havia levado a espingarda a cartucho, e ficou a apontando em sua direção. Mas antes dele puxar o gatilho, a onça ficou acenando para ele com uma das patas. Meio confuso desistiu de atirar na onça, porque não sabia o que ela queria dizer através da cena que fazia com uma das suas patas. E ao se aproximar mais um pouco da onça, ela pediu que ele a ouvisse.

Seu Leodoro, querendo dar ênfase a história que contava seu Galdino, disse-lhe que não duvidava do que ele estava lhe contando, porque nos dias de hoje, tudo é possível. Uma de suas razões para crer em sua história, era o que estava vendo como: mulher ficar feito uma mocinha, e outra ter o seu próprio filho, sendo esta, a chamada barriga de aluguel. O homem de idade adquirir potência igual a um jovem. Uma vaca ter cinquenta, sessenta, cem bezerros em um único ano. O homem pisar na lua. Bebê de proveta..., e com estas novidades, ele não duvidava mais de nada. Tinha certeza que seu Galdino estava falando a verdade, que a onça que ele a viu, falava.

E lá continuou seu Galdino, que ouviu da própria onça, que não a matasse, porque a sua espécie estava em extinção. E a terra para permanecer viva, e alimentando todos os seus viventes, precisa de tudo quanto Deus havia deixado. E ainda alegou que, as doenças que atacam a humanidade, é justamente a falta de certos animais que desapareceram do planeta, por causa do homem, que com suas invenções, vão os matando nas covardes tocaias, e em perversas armadilhas... Assim como o motor que precisa de óleo, de gasolina, de velas, de rodas para se locomover, também é a natureza, que precisa de tudo que Deus deixou sobre ela, porque se faltar alguns dos seus complementos para a sobrevivência dos animais, não demorará a extinção de todos os animais, principalmente da raça humana.

Seu Leodoro apreciava o que dissera a onça ao seu Galdino. Já tinha sido um devastador da natureza, mas atualmente era um grande protetor. Não matava nem mais uma formiga, e quando estava em seus trabalhos, e via uma formiguinha carregada de folhas passando pro outro lado, ele parava e deixava ela passar.

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E continuava seu Galdino, que a onça lhe dissera que o único culpado é o homem, que é mais animal do que o próprio animal irracional. Reconhecia o seu extinto perverso, que só com uma patada, mata um animal do seu tamanho. Mas nunca matou para deixar apenas sem vida, matava porque era o seu alimento, já que não comia capins e nem frutas. E é felino carnívoro. E se não usasse de suas crueldades, na hora do ataque ao animal, com certeza, sua presa escaparia, e ela ficaria com fome. 

Ainda lhe dissera que, o mais perverso do mundo é o homem. O animal mata para sobreviver, e o homem mata por vingança, pelo o dinheiro, pela ambição, e sem nenhum proveito, porque ele não come carne do seu semelhante. Quando elimina a vida de um, ali mesmo a deixa, e vai embora.

A onça lhe dissera ainda que estava sobre àquele galho, e ele mesmo, sabia que a sua arma era bem mais rápida do que ela. Desse-lhe uma chance, pois dali, não podia correr diante dele. Deixasse-a descer e seguir em busca dos seus 4 filhotes, que lá dentro de um toco de árvore, haviam ficado sozinhos. E se ele a matasse, os seus gatinhos iriam morrer de fome. Como iria se defender da sua arma, se estava sobre o galho com difícil locomoção?

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Depois das lamentações da onça, seu Galdino ordenou à sua descida da árvore, e fosse embora, porque ele não iria usar covardia contra ela. Confiante do que ele lhe prometera, a onça desceu da árvore, e saiu vagarosamente, em busca dos cerrados.

Finalmente, seu Galdino terminou  a sua história, e tinha plena certeza que seu Leodoro estava convencido que os animais também falam.

Seu Leodoro tinha ouvido todo esse romance da onça e do seu Galdino, e não querendo ficar no prejuízo sobre histórias de onças, iniciou com uma que havia acontecido com ele, quando ainda era um perseguidor de animais nos cerrados. Matava só para ver a queda.

Ele ainda era solteiro, dizia ele ao seu Galdino, e estava noivo com a Gertrudes. Como ela sempre sonhara em possuir uma jaqueta feita com couro de onça, exigiu que ele procurasse matar uma onça nos cerrados, para a fabricação desta peça tão sonhada e desejada. E de pressa iniciou a sua história.

Certo dia, pela manhã, contava seu Leodoro ao seu Galdino, entrou nos cerrados, levando consigo uma espingarda de boa marca, carregada com chumbo grosso e bem batida com bucha de mororó, mais uma alongada e afiada faca na cintura. Bem próximo a um cabeço de pedras, viu uma onça vermelha, que ao vê-lo, se irritou com a sua presença.




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E antes que ela partisse para lhe devorar, levou a espingarda à altura do peito, mirando em sua direção. Mas a onça foi tão rápida, que de imediato pulou sobre ele, dando uma tapa certeira na espingarda, deixando-o desarmado. Mas como ele conduzia a faca na cintura, rápido, puxou-a da bainha, e lá ficaram os dois lutando, embolados, isto é, a onça e ele. A onça dava cada pinote quase que alcançando o seu pescoço, para sangrá-lo. E em um momento que ela se distraiu, e fez o seu malabarismo em forma de rodopio, ele rolou o seu couro, pegando a parte da sua cintura. Sabendo que ela não desistiria daquela luta, agarrou-se em sua calda. Assustada, a onça partiu em disparada carreira, conduzindo-o de cerrado adentro. A danada da onça alcançou a sua maior velocidade, mas ali, ele estava presente, agarrado em sua calda, sem soltar em nenhum momento.

Tinha momentos que ela dava cada pulo, e ele subia e descia com ela. Ao passar sobre um galho que havia caído sobre umas avantajadas pedras, o salto da onça foi exagerado, que com o impulso e a caída deles pelo o outro lado do galho, quando percebeu, ele já estava montado nela. E tome carreira, isto sem parar, e já estava bastante suado, cansado, com a língua de fora, mas mesmo assim, não tinha planos de desistir, porque o que ele queria, era o couro da malvada onça, para a fabricação da jaqueta da Gertrudes.

Ao notar que estava montado na onça, enfiou os dedos no corte que ele havia feito nela, no momento em que lutavam, assim como um peão de rodeio, que segura a corda laçada, sobre a barriga do touro para não cair. A sua sorte foi que, ao passar por outro galho derreado, em vez dela pular por cima, resolveu passar por baixo, deixando-o enganchado nos ramos da árvore. A onça foi embora, mas ele notou que sua parte traseira estava meio branca, e com algumas listas avermelhadas. E assim que ele se desenganchou dos galhos da árvore, notou que o couro do meio de toda parte traseira da onça, estava em suas mãos.

Seu Leodoro lastimava que tinha perdido  o couro completo da onça, mas se gabava que, havia saldado a metade do couro. Como o couro não dava para a confecção da jaqueta, aconselhou a  Gertrudes  que mandasse o fabricante de gibões confeccionar, pelo menos uma bolsa.

Terminada a história, despediram-se, e cada um seguiu em direção às suas casas.

Enquanto seu Galdino caminhava em direção à sua residência, dizia consigo mesmo: "- Eu sei qual é a bolsa que a Gertrudes tem! É tão grande, que cabe dentro dela dez rapaduras cariris. A sua bolsa está localizada bem no meio das pernas!".



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